domingo, 5 de dezembro de 2010

Idosos aderem a redes sociais e passam a produzir conteúdo na web

Eles não precisam saber informática para exibir no currículo. Até porque, na época em que ingressaram no mercado de trabalho, o importante era ter domínio das técnicas de datilografia. Para os indivíduos com mais de 65 anos, o computador tem se revelado um bom aliado para estimular a memória, adquirir novos conhecimentos e fazer contato com outras pessoas. Os idosos — antes vistos como meros leitores de notícias — agora já utilizam a internet para entrar em páginas de redes sociais e até produzem conteúdo para sites e blogs. Aliás, muitos especialistas já têm recomendado que a terceira idade acesse a web como terapia ocupacional, pois, além de preencher o tempo, o internauta pode ampliar seu círculo de amizades e derrotar a solidão.
Para o coordenador do setor de Geriatria do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da UFRJ, Carlos Montes Paixão Júnior, a internet pode ser uma alternativa para minimizar a carência afetiva, já que, a partir desta etapa da vida, é comum a diminuição do contato com outras pessoas. Os motivos são muitos: saída do trabalho, problemas de saúde, morte do companheiro ou de amigos. “O principal problema da deterioração da rede social certamente é o isolamento e a vulnerabilidade a que essas pessoas passam a ficar expostas, com aumento possível até de mortalidade”, ressalta ele.
Um dos primeiros registros do uso do computador como forma de terapia no Brasil data do fim da década de 80. Segundo reportagem do jornal “O Globo” de agosto de 2008, um dos pioneiros da terceira idade a desbravar o mundo digital foi um homem chamado Roberto Duarte, que morava no bairro de Água Santa, na Zona Norte do Rio. Ele estava afastado do trabalho por licença médica, e, como terapia ocupacional, seu médico indicou-lhe usar o computador. Em poucos meses, ele se tornou dono do maior acervo de software da cidade. Para isso, recebia em casa pessoas interessadas em trocar softwares, o que consequentemente aumentou seu grupo de relacionamento.
Cerca de 20 anos depois, o crescimento no número de amigos em função do computador se deve mais ao bate-papo virtual do que presencial. Além de dominarem sites como Orkut, Facebook e Myspace, os idosos têm aderido à tendência de segmentação das redes sociais. Nos Estados Unidos, há diversos portais exclusivos para a terceira idade. O Eons.com, por exemplo, é voltado para pessoas com mais de 50 anos. A página oferece jogos interativos para estimular a potência cerebral, além de informações sobre entretenimento para pessoas mais velhas. O internauta que acessa o portal pode ainda calcular sua longevidade e obter dicas sobre como viver mais. Há ainda o MyWayVillage, uma rede social que funciona até mesmo em casas de repouso em Illinois e Massachusetts. No Brasil, há o portal Mais de 50, que oferece notícias sobre sexualidade, maturidade e nutrição, voltadas à terceira idade. O site também busca promover encontros reais da comunidade virtual para fortalecer as trocas afetivas.
Alguns estudos indicam que a solidão pode, inclusive, aumentar a demência. Em uma reportagem do jornal americano “The New York Times”, o sociólogo greco-americano Nicholas A. Christakis, professor do Departamento de Políticas de Assistência Médica da Universidade de Harvard, diz que planeja fazer uma pesquisa para determinar se as conexões sociais online serão capazes de retardar a demência, como os encontros físicos entre as pessoas provaram fazer.
Contribuição para sites e blogs pode ajudar os idosos a se sentirem produtivos
Além de ajudar os idosos a derrotar a solidão, o contato com a tecnologia tem feito com que eles voltem a se sentirem produtivos. Os maiores de 65 anos já são considerados um público fiel de seções de jornalismo participativo. E, um estudo recente da organização de caridade Booktrust mostra que cerca de 31% dos britânicos acima dos 60 anos têm vontade de publicar contos na Internet e de se associar a clubes do livro. O Bookbite, por exemplo, é um projeto para leitores e escritores com essa idade. A pesquisa, que entrevistou 1.162 pessoas, revelou ainda que 55% dos idosos disseram que encaram a internet como crucial nas suas vidas.
No Brasil, o acesso à internet pelo público da terceira idade ainda é tímido se comparado às outras faixas etárias. A última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) sobre acesso à internet e posse de telefone móvel celular para uso pessoal, realizada em 2008, mostra que o grupo de 15 a 17 anos foi o que apresentou maior percentual de utilização da internet (62,9%). Segundo o estudo, apenas 11,2% das pessoas com 50 anos ou mais usam a web (o grupo representa 24,8% da população total, mas apenas 8% daqueles que acessaram a internet).
A mudança na forma com que os idosos passaram a encarar a tecnologia se deve não somente ao aumento da longevidade, mas, sobretudo, à melhoria da qualidade de vida na velhice. O professor Carlos Montes Paixão Júnior lembra, no entanto, que eles acabam enfrentando algumas limitações físicas no uso do computador. Entretanto, dificuldades como essas podem ser contornadas através da utilização de equipamentos mais adequados, como teclados e monitores maiores. “O computador permite, mais do que outros meios de comunicação, a adaptação das incapacidades consequentes das dificuldades visuais, auditivas, entre outras. Talvez, a questão principal seja, como para todos, não ficar muitas horas sentado, por questões ergonômicas”, ressalta ele.
O coordenador do Projeto Inclusão Digital do Instituto de Professores Públicos e Particulares (IPPP), Fabbio Gonçalves, ressalta que o medo de lidar com a máquina é a principal dificuldade específica da idade no trato com o computador: “Mas, isso é cuidadosamente trabalhado e vencido com o andamento das aulas”. Desde 2006, o IPPP oferece cursos de informática, com duração de um mês e meio, inteiramente gratuito aos seus participantes. Neste período, já foram atendidos mais de três mil alunos. Deste total, cerca de 60% são de idosos. Atualmente, as aulas são ministradas na Biblioteca Municipal Machado de Assis, em Botafogo, no Rio.
Segundo Fabbio Gonçalves, vencida a primeira barreira, os idosos passam a querer descobrir as diversas formas de comunicação via internet, como o Orkut, o Facebook, o MSN: “A descoberta de poder se comunicar com amigos e parentes em qualquer lugar do mundo desperta um grande fascínio em cada um. Com isso, surge a vontade de conhecer mais e realizar novas conexões”.

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